Eu venho de uma igreja que sempre confundiu santidade com seriedade, ou ainda, "quadradez". O exemplo de santidade era aquele irmão carrancudo, que tinha um celular Nokia 6310 (o tijolão) só pra receber chamadas porque "Whatsapp é vaidade" e andava de terno num calor de 40ºC.
O "cristão raíz" era aquele que não tinha televisão, não torcia para um time de futebol, e achava pecado bater uma bola na rua de fim de semana. E tudo isso era feito com o intuito de "se separar do mundo".
Este pensamento é ainda mais comum entre as lideranças das igrejas, que se isolam numa espécie de vida de profeta ermitão na tentativa de serem mais santos. Porém isso é exatamente o contrário daquilo que Jesus fazia.
Jesus sempre esteve no meio das pessoas mais socialmente reprováveis do seu tempo. Ele tomava refeições com cobradores de impostos (estes caras eram judeus que trabalhavam para o imperador Romano, então eram vistos como traidores da pátria), permitia que as prostitutas se aproximassem dele e andava com o povão.
Em uma de suas parábolas, Jesus nos ensina que o reino dos céus é como uma mulher que coloca um pouco de fermento numa grande quantidade de farinha, e toda a massa fica fermentada. Nosso chamado enquanto cristãos não é uma espécie de isolamento budista, mas sim a transformação das circunstancias ao nosso redor.
Claro, tenha em mente que existe o perigo da secularização e aculturação do cristão. Existe sim a possibilidade de que ao invés de um cristão santificar o seu grupo de futebol de quarta à noite, o grupo de futebol de quarta à noite "mundanize" o cristão, ou seja, torne o cristão em um descrente. Mas ainda assim, me parece que a maioria das igrejas pentecostais estão optando por um isolamento absoluto do seu grupo.
Ao nos isolarmos em nosso universo cristão seguro, dois problemas acontecem: a falta de evangelização (ou a falta de uma evangelização eficaz), e a "fé de cristal".
Falta de evangelização
Quando a igreja se isola, existem dois cenários possíveis quando falamos de evangelização: A falta de evangelização, ou uma desconexão da realidade tão grande, que qualquer tentativa de evangelização seja em vão.
É muito fácil criarmos um pensamento hiper calvinista dizendo: "Aqueles que são predestinados vão cair dentro da igreja por algum milagre, logo, não preciso evangelizar". Isso vai diretamente contra uma ordem direta de Cristo na Grande Comissão. Além de anular as palavra de Paulo aos Romanos, dizendo que só podemos crer em Cristo ao ouvirmos a palavra de Deus.
O segundo caso, é um cristão que se isolou de tal maneira que ele deixa de ter qualquer coisa em comum com aquela pessoa que ele está tentando evangelizar. Especialmente na nossa sociedade atual em profunda decadência, onde encontramos um golpista a cada esquina, é natural que as pessoas estejam fechadas a qualquer nova ideia que venha de um estranho.
Então, um cristão que não consiga se conectar de maneira nenhuma com o seu alvo de evangelização irá ter muitas dificuldades em entregar a mensagem de Cristo.
Isto também está relacionado a pessoas de culturas diferentes. Não podemos evangelizar um cigano da mesma maneira que vamos evangelizar um coreano, ou um americano ou ainda um indiano. E isso também inclui as suas subculturas. Evangelizar um americano rockeiro de Nova Iorque vai ser diferente de evangelizar um nativo americano da tribo dos Pawnees.
Fé de Cristal
O segundo problema de uma comunidade cristã que se isole é algo que eu chamo de fé de cristal. Isso afeta principalmente os jovens da comunidade. Uma vez que os jovens vivem sem que ninguém questione suas bases de fé dentro da igreja, os jovens estarão em grande perigo de desmoronar ao se encontrarem com o menor sopro do ateísmo.
É o que acontece muitas vezes quando jovens ingressam nas faculdades ou são aceitos em um estágio. É por isso que estudos como Apologética (a defesa da fé) são importantes até mesmo nas Escolas Bíblicas Dominicais.
E a parte mais triste da fé de cristal é que dois caminhos se apresentam para os líderes de uma igreja que já esteja sofrendo com este problema: incentivar o contato com o mundo exterior de maneira saudável e arriscar a vida espiritual de alguns jovens, ou aumentar ainda mais o isolamento dos jovens, piorando ainda mais o problema.
Independente da situação, o isolamento da comunidade não é bom nem para as pessoas de fora, por deixarem de ouvir as boas novas de Jesus Cristo, nem para as pessoas de dentro da comunidade, por torna-los vulneráveis a qualquer questionamento da sua fé.
Foi exatamente por isso que Jesus faz a seguinte oração em João 17
Não rogo que os tires do mundo, mas que os protejas do Maligno.
Eles não são do mundo, como eu também não sou.
Santifica-os na verdade; a tua palavra é a verdade.
Por isso, seja fermento! Viva transformando as coisas ao seu redor! Utilize o Brasileirão (talvez a Premier League seja mais legal de assistir, mas essa é a minha opinião :D), a NBA ou o Vôlei como ferramentas para o evangelho!
Não importa quais são os seus gostos. Carros esportivos, maquiagem ou natação, todos podem ser utilizados como um ponto de identificação com as pessoas, e sempre tem alguém que ainda não ouviu a mensagem de Jesus Cristo.
Como disse o grande teólogo Karl Barth
Devemos segurar a bíblia em uma mão, e o jornal na outra
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